quinta-feira, outubro 28, 2004

Vidinha que é minha

Quando se senta a porta do rancho para matear é que se achega de mansinho, os pensamentos. Sestrosos de primeiro, para depois soltarem as rédeas num galope em disparada. Enquanto o dia se vai e vêm as lembranças é que o índio taura pensa, não só na lida, mas no que é feito da vida.
A mim me gusta muito trançar lembranças e sonhos futuros. Principalmente aqueles que, por mais distantes que estejam, trago para bem pertito. Não são sonhos de riquezas, vida abastada, nem mesmo com uma estanciola sonho eu. Tenciono estar junto de minha bem-amada, um piazito, um ranchito, um cusco ovelheiro, cavalo bom... "vidinha que é minha só pro meu consumo". Se o Patrão de nosotros todos quiser me conceder tais coisas declaro-me o qüera mais satisfeito destas paragens. Pois como disse mui sabiamente Jesus, o Cristo: "Pra que juntar tesouros onde a ferrugem e a traça destroem!?", quero é guardar aquilo que vale de verdade. Que homem algum pode tirar e que por faceiro, no campo grande do céu vou continuar a mirar.

Porto Alegre, cheia de outubro.

terça-feira, outubro 26, 2004

Por um abraço

Gujo Teixeira

Deu saudade minha linda, deu saudade!
Pra dizer bem a verdade foi assim...
Era tarde e o meu rancho por solito
te encontro nessa lembrança junto a mim.

Repontou saudades doces, feito um beijo
No destino mais amargo que ela tem
Quem me dera, esse mate em outra tarde
Tomar um, e alcançar outro para alguém.

Só depois que desencilho e o dia acalma
Nas quietudes costumeiras da querência
Nos teus olhos cor de noite e domingueiros
Me transporto e conto os dias desta ausência.

Mês passado, minha linda, tu bem sabes
O temporal encheu o passo da cruzada
E o gateado que não sabe o que é saudade
Por cismado, não cruzou o vau da estrada.

Eu aqui, entre os mates faço uns versos
Desses largos pra enganar a solidão
Por que a alma tem razões desconhecidas
Que nos fazem ser por vezes solidão.

Quem sabe o tempo, soberano das esperas
Fim do mês, não abra o céu e eu cruze o passo
Pra matear, um fim de tarde no teu rancho
E trocar ausências sim!! Por um abraço!!



Porto Alegre, crescente de outubro.

domingo, outubro 24, 2004

"Na madrugada alta e tranqüila, engrinaldada de estrelas, um homem a cavalo alcançava os arredores de Boa Ventura. O chacre rio repousava, soturno. Um frescor perfumado alertava os sentidos. O cavaleiro cuidava as sombras do caminho. No peito cerrado pela bronquite asmática que o torturava, abrigava ainda outra aflição, que crescia à medida que se aproximava de casa. Aquela cena e aquele estado de animo repetiam-se pela terceira vez. Ele não temia a cadeia, temia a vergonha de ser preso por roubo. Mas caiporismo, a desocupação, as exigências do sustento da família, a idade e a doença, sim, também a doença arrastaram-no àquilo: a roubar!"

Quem vive de changa não pode estar satisfeito com a sua dura sorte. Quem empeça um sonho e dá com os burros n'água sofre um suplício. E quem vive uma desilusão, não pode sonhar, nem experimentar aquilo que chamamos de esperança. Sem sonhos e esperança o taura vira bicho e o bicho vive de instinto.

Porto Alegre, crescente de outubro.

sexta-feira, outubro 22, 2004

Encambichado com a lida....

Buena vida, já dizia o Lambari, mas que buena vida...
Pues que indiada, estamos encambichado novamente. Tenemos que pensar enquanto mateamos acolherado nos umbrais da casa. Um gaucho sem a percanta..mas tche, que desgraça! O fato é que o Patrão Velho cuida dos seus, e fez o minuano assobiar nos ouvidos campeiros, e logo nos fazemos auditar pela melodia daquela voz meiga e serena...
A mis amores, já dizia Dom Marenco, o pingo, a china e o pago...
Bueno que existas, Dna.Camila...Que o Patrão Velho providencie o ranchito pra que possamos nos acholherar....
Porto Alegre, Outubro de 2004.

quinta-feira, outubro 21, 2004

Saudades

O friosito destes dias me tem feito lembrar do inverno. Das coisas boas que só podemos fazer nesta estação do ano. No entanto, há quem diga que não gosta do frio, pois eu aprecio umas quantas "veiz". A madruga ainda escura, enrigelada, a cerração, a geada, um fogo de chão, o mate recém cevado, puchero... É claro que eu não descarto as dificuldades enfrentadas no inverno, mas, para mim, se comparadas com a dos dias quentes não são nada. Só que, o friosito que aí está se vai de vereda e fica para nosotros as saudades do inverno. E as saudades patrícios são como estações no ano, ora vem quente e suarentas, ora frias e enrigeladas. Só quem não tem saudades não sabe disso e não falo somente da saudade passional. Com o verão a saudade da primavera chega somada a do inverno, e a do outono e todo o ano se repetem as vezes sanadas, outras cultivadas mas sempre há uma saudade. Assim como sempre acabam as estações do ano. e tu patrício podes pensar que melhor seria então que não atentássemos para as estações afim de não sentir saudades. Discordo e explico: se vivemos plenamente cada estação a saudades que sentiremos dela será embalada por boas e singelas lembranças, do contrário a única coisa que teremos será a mais triste das inquietações: Ah! Se tivesse feito tal côsa!

Porto Alegre, crescente de outubro.

terça-feira, outubro 19, 2004

O bolicho do livro...

Indiada macanuda,
tamô abrindo mais um canto do galpão pra charlar sobre das coisas da terra! Lançamo o blog Taipa Livresca que é uma produção do Capando Touro a Unha by Marcador. Se quiseres escever una payada, una cantiga ou até das uns trancaços nos homenageados aparece por lá...
O endereço é http://taipalivresca.blogspot.com
Provincia de São Pedro, Outubro de 2004.

Pealando tropa...

Buenas cumpadre tamo aí de novo,
Las emociones no grosso da "pel", todo dia enfrenando um mate bagual, enquanto na tábua do pescoço bamô aguentando o trancaço da lida...
Os gritos campeiros do Patrão em meio a gadaria, o criollo troteando como se fosse da cavalaria farroupilha, e chão estremece enquanto as patas do zaino arrebentam a terra, e os patricios Castrador, Curador e Maneador, vão apartando as vacas dos terneiros. Bueno...a lida continua...
o dia recém nasceu no poente, e se bamô de á cavalo que o mango grudado no cabo da faca tá coçando pra arrebentar a pau...
Á carga, indiada, viva a república rio-grandense, viva a liberdade...
Provincia de São Pedro do Rio Grande do Sul, Outubro de 2004.

E o gaúcho...

"O que eu vinha enxergando desde tempito largo (...) era que nós todos, os pobres da campanha, ia acabá emangueirados, como capão pra consumo. E sabem onde? Aqui mesmo, na aldeia, neste cisco."
(Cyro Martins, Porteira Fechada p. 40)
O trecho foi extraído de um romance, mas a realidade não é diferente do relatado. O campo transformou-se, e muito. Hoje tratores, motos e colhedeiras fazem o que faziam homens, cavalos e peães. Contudo, o que mudou no campo não foram realmente as tecnologias e técnicas de produção. Na verdade a mudança aconteceu há muito tempo. Não foram as máquinas que tiraram o homem do campo, foi a ganância de uns em detrimento a liberdade de outros. Durante longos anos o gaúcho sentiu-se livre e senhor de si mesmo. Quando o patrão botou cerca e casa grande na campanha e a sua liberdade se tornou ainda mais virtual. E quando se precisou de mais espaço para o gado quem saiu não foi o patrão, é claro. Apinharam-se no povo, embretados nas vilas e changueando alguns trocados. Assim foi, assim é e assim será. E a liberdade!? Esta é cada vez menor, cada vez mais distante e cada vez mais virtual. E o gaúcho!? Bem, o gaúcho...

Porto Alegre, nova de outubro.

sábado, outubro 16, 2004

Amigos

Amigos, amigos, amigos cada amigos a mais é uma saudade a menos.
Eu ouvi isso em algum lugar não me lembro bem onde foi, sei somente que é uma grande verdade. Tenho provado com os meus patrícios grandes gauchadas que são meu orgulho nesta existência. Não é só a prosa amiga, mas os momentos de silêncio em que, o que sabemos um do outro valem mais que mil palavras. E nessa convivência mateaça seguimos, um amadrinhando o outros na ventura e nas desventuras, certos de que nunca seremos deixados de lado por esses que temos um grande apreço. Estender a mão e prosiar é nossa filosofia, não julgando, apenas fazendo nossas as dores do amigo, as paixões dos amigos e as amarguras dos amigos. Retribuindo cada elogio e chorando junto em qualquer mágoa. E se empeça alguma peleia somos os primeiros a terceiar o ferro por causa de nossos patrícios.
Ao Patrão de nossotros todos agradeço pelos meus patrícios e pela vida que me é mui buena.

Porto Alegre, nova de outubro.

quinta-feira, outubro 14, 2004

A Estância, o Piá e a Percanta...

Ontem ao chegar descogonado da lida, me atirei nos pelegos e adormeci com as idéias mergulhadas em preocupações. De vereda, passei ao sonho que creio ser coisa do Patrão Velho. Estava na estância, atirado na varanda da casa, quando vinha a trotezito bem compassado um guri, de pés descalços, bombachas remangadas e sem camisa, com uma tez branca e olhos verdes, loiro como o sol que refulge e com um sorriso matreiro, ao tapear com graça e carinho, as fuças do cusco que vinha pealando e acoando nos seus garrões. Vinha se aproximando de mim e gritando: "Pai, pai, olha como pula o gavião".... De certo era este o nome do cusco. Mas o sonho só fez completo, depois que ouvi a melodia daquela voz meiga e serena aos meus ouvidos, chegando como uma cantilena por detrás dos umbrais das casa: "Oi, cheguei"... Era ela, minha D.Caetana, a Sra. da estância que estava lá pras bandas de Pelotas, pois afinal ela é uma percanta douta e tem o hábito de ensiná os outros índios a pensar, e por isso tem que muito viajar. "Senta aqui pertinho, minha prenda, o amargo já tá vindo e logo, logo o almoço tá na mesa. - Josefa, põe mais um prato que a Dona da Casa chegou.." Saltou a negrinha, loca de facera, dizendo:"Tá bueno patrão, é pra já" Minha prenda, cabelos ruivos e tez branca como a do piá, sentou-se ao meu lado e se atracamo a charla das novidades de sua viagem e estada em Pelotas....Depois disso acordei, com uma sede de camelo e botei um milongão, pra iniciar a lida...
Porto Alegre, 14 de Outubro de 2004

Esperança

Bueno, depois de um jejum de alguns dias sem escrever, confesso que senti falta. Escrever é um exercício muito interessante para aqueles que têm o hábito. Mas para hoje nada de conto, onde a personagem principal sempre acaba em desgraça - aliás se eu fosse inventava até de fazê analise - vou voltar ao meu velho estilo, aquele que olha para dentro.
Tenho nos últimos dias pensado bastante sobre o futuro, principalmente o meu futuro e o de minha Florecita. E mesmo sendo translúcido o horizonte que miro conservo a esperança, não aquela sega que torna os homens visionários, mas a sadia que consegue, mesmo sem ter os pés no chão, sentir segurança. É como o guri que pela vez primeira arruma os avios de pesca e sai faceiro já pensando na volta, nos peixes, nos causos para os amigos. Ou que tateia no horizonte estrelas sonhando com um mundo encantado. A esperança é de muitas formas, de muitas cores e sentidos contudo, é uma em intensidade de espera: cautelosa e sorridente. Aos que desesperançados vivem sugiro um esforço, principalmente agora quando a pampa renasce, olhe na volta contemple a criança, o nascer do sol, a lua... quem sabe ela brote dentro do teu peito deixando raízes no coração.
Porto Alegre, nova de outubro.

quarta-feira, outubro 13, 2004

"E a melodia de tua voz, meiga e serena...."

Pra falar das prendas yo soy bueno unas quantas vezes....
Uma pergunta pertinente seria o que é do xirú pampeano quando retorna de uma tropeada e não encontra a guaina amada e santinha, limpando os peçuelos no costado do ranchito?
E quando a guria é campeira, uma barbaridade, e acompanha o taludo de à cavalo pelas invernadas...
Mas tche, felizes são Dom Tiago e Régis, por que já acharam duas flores do rincão véio bagual. E yo e Dom Josué, estamos campereando solito, por enquanto.... Mas gurias se preparem que tamôs chegando, porque em matéria de mulher bonita nós somo que nem alpargata, servimo tanto para um pé como pro outro....Mas tche...
Quebra-costela....

segunda-feira, outubro 11, 2004

Buenos Dias


Buenas indiada nossa primeira postagem no tal do blogi.
Pra começar os apresentamento, yo soy o marcador.
Diretamente da capital de todos os gauchos para o interior mais bagual e campeiro, tamo chegando para marcar a ferro as paletas de qualquer tubiano que se enveredava defronte os óio. Enfim, chegamô pra se instalar...bueno tamô mais facero que mosca em tampa de xarope...
Muchas gracias

sexta-feira, outubro 08, 2004

"Maria enche a caneca de leite "proquê" o carreteiro de meio-dia tava salgado." Maria foi até o balde de leite, tirado pela manhã da vaca salina que dava uns bons dez litros. Alcançou a caneta loçada para Nicácio que num gole tomou-a toda. "a la pucha que a sede não mermou". Deu um olhada na volta e rumou para o catre: "pode ser que despois da sesteada o mal-estar diminua". Maria as voltas com a frangaiada, remoía a desfeita que Nicácio lhe fizera na noite passada. "Precisava chegar borracho!? Precisava ter me batido!? Por acaso sou china de regimento!?" e o milho triturado ia bater no chão enquanto Maria pensava as galinhas e galos comiam e cacarejavam.
Nicácio ainda dormia quanto Maria fez a trouxa, roupa mesmo não tinha apenas alguns trapos que o Nicácio lhe dera, e sem bombear para trás seguiu pelo trilho que ia dar no lajeado. Caminhando sentiu-se tão distante de seu rancho, como se estivesse a léguas dali, nem uma lembrança mais restara daquele lugar... ilusão, pura e simples ilusão. De repente o que vem a sua mente são seus dezesseis anos quando Nicácio fora buscá-la na casa de seu pai, depois os filhos o aborto... Lembranças, e a cada passo a frente parecia que voltava dois para trás. Só voltou a si quando pisou na água fria do lajeado.
Nicácio acordou suado, esgualepado por causa da borracheira, lavou o rosto e no pátio foi entrar Maria que dava comida para as galinhas e os galos que cacarejavam.

Porto Alegre, minguante de outubro.

quinta-feira, outubro 07, 2004

Matutando

De volta à capital a maioria das coisas tornaram a sua rotina, esta já condenada por mim a algum tempo. Pois bem, não empecei este a fim de escrever sobre ela novamente. Na verdade quando liguei o computador tinha uma idéia, bem diversa da que tenho agora ou da que tive a um segundo atrás. Essa é a grande tarefa de quem escreve algo: transformar em frases e orações todo aquilo que pensa. E nem sempre o que pensamos é concebível em forma escrita, ora por incapacidade, ora por pudor.
A tarefa torna-se mais árdua quando se escreve sobre coisas que se gosta muito. Pois temos a tendência de idealizar o que gostamos, e não poderia ser diferente quando escrevo este post ou outro qualquer que já tenha escrito. Na verdade este são reflexos do que imagino ser a realidade, que não é nem real nem i-real, apenas única e especial para mim. Comunica apenas na minha existência pois, é concebida a partir de mim. Não quero que pensem, patrícios, que estou sendo buliçoso apenas falo que experiências são únicas para cada indivíduo, e comunicativas e perceptíveis de forma única também. Bueno, mas essa não era a intenção deste post... o pior é quem nem me lembro do que ia escrever por primeiro. Sendo assim, me despeço ainda procurando o que queria escrever antes de começar, quem sabe amanhã saí.

Porto Alegre, minguante de outubro.

terça-feira, outubro 05, 2004

Barreiro

Enquanto o barreiro colocava o pouco de barro que tinha no bico junto do resto que já havia colocado, sua companheira ia até a sanga beber água e se refrescar. Puxa-barro-coloca-barro, puxa-barro-coloca-barro, puxa-barro-coloca-barro... E assim, no final da primavera, estava pronto o ranchinho daqueles dois apaixonados. Sem dúvida estavam faceiro cheios de esperança e sonhos. Tudo estava como um dia claro, como primavera na campanha. Depois da casa pronta vieram os filhotes e veio também o trabalho para alimentá-los. Tudo seguia ao passo tranqüilo do trote manso da sanga.
Mas a paz se foi e a tristeza veio tomar conta daquele ranchinho e o barreiro não mais cantava soluçando solito. Sua prenda numa noite em que saíra para caçar minhocas, fora levada por uma coruja e os filhotes sozinhos acabaram por cair do ninho e não tiveram sorte diferente da mãe.
Sem família, sem a amada, sem os filhos. Ficou parado a mirar o ranchinho, e a lua bem cheia no céu parecia com ele chorar bem mansinho. E a vida, que tinha lhe dado um pealo, deixara-lhe tristonho sem ter rumo, nem norte. Apenas a dura sorte de ser solito e gaudério.
Porto Alegre, cheia de outubro.

sábado, outubro 02, 2004

Eleições 2004

Estou em Três de Maio desde sexta e aqui não poderia ser diferente dos outros lugares. Carros de som, troca de acusações, aquelas músicas de campanha que são horríveis... e eu que vim para cá em busca de silêncio e tranqüilidade. Não sou contra processos democráticos e eleitorais, contudo sou a favor do equilíbrio em todas as coisas. Tchê, exatamente agora cruzaram três carros de som, de diferentes partidos, todos com o som lacrado e eu que não tenho nada a ver com a pendega tenho que ficar escutando.
Patrícios, desta vez o descanso foi pouco e o pior é a crise de renite que me pealo. No mais amanhã me largo para Giruá, rever a família, e no mesmo dia a noite me mando de volta para POA. Eu que tencionava por minutos de sossego e tranqüidade dei com os burros n'agua. Quem sabe a,anhã cedito eu ouça pelo menos o cantar dos galos, sem que, um vote eu Fulano atrapalhe.
PS: Não fiz nenhum comentário de cunho político pois faz parte das normas para o bom funcionamento do blog.
Três de Maio, cheia de outubro.