terça-feira, outubro 05, 2004

Barreiro

Enquanto o barreiro colocava o pouco de barro que tinha no bico junto do resto que já havia colocado, sua companheira ia até a sanga beber água e se refrescar. Puxa-barro-coloca-barro, puxa-barro-coloca-barro, puxa-barro-coloca-barro... E assim, no final da primavera, estava pronto o ranchinho daqueles dois apaixonados. Sem dúvida estavam faceiro cheios de esperança e sonhos. Tudo estava como um dia claro, como primavera na campanha. Depois da casa pronta vieram os filhotes e veio também o trabalho para alimentá-los. Tudo seguia ao passo tranqüilo do trote manso da sanga.
Mas a paz se foi e a tristeza veio tomar conta daquele ranchinho e o barreiro não mais cantava soluçando solito. Sua prenda numa noite em que saíra para caçar minhocas, fora levada por uma coruja e os filhotes sozinhos acabaram por cair do ninho e não tiveram sorte diferente da mãe.
Sem família, sem a amada, sem os filhos. Ficou parado a mirar o ranchinho, e a lua bem cheia no céu parecia com ele chorar bem mansinho. E a vida, que tinha lhe dado um pealo, deixara-lhe tristonho sem ter rumo, nem norte. Apenas a dura sorte de ser solito e gaudério.
Porto Alegre, cheia de outubro.

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